terça-feira, 17 de maio de 2011

Gente diferenciada quer ser diferente?


Caro morador de Higienópolis e quaisquer-outro-cantinho-burguês-quatrocentão-elitista-da-cidade,

Eu me simpatizo com você, sabia? Sou diferenciado sim, ma non troppo. Queria ser igualzinho a você, que compra batata pelo dobro do preço no Pão-de-Açúcar da Angélica. Aliás eu sou muito mais da turma do titio Abílio. Construir uma estação de metrô neste lugar vai me obrigar novamente a pagar centavos de real num pão francês do boteco da outra esquina. E eu confesso que adoro comprar os produtos do Olivier Anquier. Mesmo que ele me custe mais do que dois bilhetes de metrô.

Vou te contar que acho saudável caminhar da estação Santa Cecília até a Rua Maranhão, onde trabalho. Ser pobre engorda, sabia? É churrasquinho no fim-de-semana, a maionese da tia, o pudim-de-pão da vó, isso sem contar a tigelinha de milho verde que eu não consigo deixar de comprar quando estou na fila do Bilhete Único. Queria dar umas voltinhas na Praça Buenos Aires aos sábados, assim como vocês. Quem sabe tomar um cafezinho na padaria do Benjamin Abraão. É aquele senhorzinho que ia na Ana Maria Braga, né não? Eu gostava dele. Mesmo que fosse só pela tevê.

A minha diferença dos meus amigos diferenciados é que eu acho o mundo de vocês o má-xi-mo. Mesmo. Admiro a capacidade que vocês têm de ficar tanto tempo dentro de um carro sozinhos. Acho que o dia que eu pegar um metrô e estiver sozinho no vagão, terei uma única certeza: estou na estação errada.

Eu não tenho brasão, nem dinheiro. Mas tenho admiração por você. Deixa eles protestarem a vontade, amigo. Por detrás do insul-film você nem consegue enxergar.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

aqueles minutos que pareceram horas.

tinha me dado uma vontade boa de dizer 'fica aqui mais alguns minutos, horas'. acendeu um cigarro bem vagabundo, daqueles que eu não suportaria nunca. mas aí tinha você, o seu cheiro, tinha seu pescoço de-li-ci-o-sa-men-te cheiroso. e eu fiquei, sem você dizer uma só palavra. queria ter calado mais a minha boca e ter te beijado. mas eu tava gritando por dentro, não tinha como ficar quieto. eu tava sucumbindo às minhas vontades, todas elas. você percebeu? adorei quando você me olhou em silêncio lá no fundo das minhas verdades. e eu sei que na tua frente não consegui esconder nada. nadinha. até o dedinho do meu pé esquerdo tava ali gritando, querendo gritar sei-lá-o-quê. mas você pegou teu cigarrinho vagabundo e se foi. eu continuo aqui, recriando meus versos, tentando medir palavras pra não parecer cafona. e eu tô cafoníssimo, sabia?

domingo, 1 de maio de 2011

Aquele que aprendeu a ouvir um não.

'Não', você disse. 
E eu não tive uma fração de segundos para entender. Talvez porque lidar com finitudes sempre foi uma constante pra mim. A finitude ironicamente pra mim nunca teve fim. Nunca me acostumei com teus elogios, sempre tão sinceros e triviais. Me apeguei às frases decoradas, aos clichês mais banais pra tentar te perceber. E ao tentar te achar, não enxerguei o que estava na minha frente e deixei escorrer pelos meus dedos. Não escutei o teu grito, o teu gozo. Preferi projetar o que eu queria, o que eu sentia, o que eu esperava. Esperava lá na beira do cais, sem resposta, sem acenos, sem terra firme. E assim nunca percebi que as coisas não são tão uníssonas assim. A forma de expressar o meu sentimento é alheia a mim, e só a mim. Cada um tem o seu jeito de externá-la. Mas eu queria que você cantasse no meu ritmo, que fodesse no meu compasso, que me amasse na minha melodia. Cantei sozinho até a minha voz sumir junto com você. Ao olhar mar adentro, esqueci do que me saltava aos olhos, à deriva, à minha espera. Mas esta espera um dia torna-se caminho, segue teu rumo, encontra outro cais. E agora, ao te ver partir para o longe, finalmente entendi. Não há mais espera, não há mais nada que não possa estar ao alcance dos meus olhos e do meu coração. A finitude desta vez não me incomoda. Pois não há mais cais nem navio, só o mar. Só um horizonte sem fim, deliciosamente sem fim. Que bom.